top of page

Conceitos importantes em Jacques Lacan

  • Foto do escritor: Douglas de Macedo
    Douglas de Macedo
  • 11 de abr.
  • 5 min de leitura

Atualizado: 13 de abr.


O Outro (grande Outro) e pequeno a


Quando alguém escreve “bom dia” num grupo de trabalho, está seguindo um código social, esperando um retorno, reconhecimento. Esse “lugar” (código) onde as regras existem, é o grande Outro conforme Lacan. É o lugar da cultura, da linguagem, da Lei. É o que dá sentido e valida o gesto. É como se fosse um “banco de dados simbólico” onde os significantes circulam. Também é nesse Outro que o sujeito busca amor e sentido. Desde a infância, o sujeito se forma em relação ao Outro, seja ele os familiares, a cultura, a linguagem ou a sociedade. Ao mesmo tempo que nos constitui, o Outro também nos impõe limites.


“Quanto ao pequeno a, lugar do eu imaginário, ele tornava-se a questão de um resto, preso no real e não simbolizável: objeto como falta e objeto como causa do desejo” (ROUDINESCO, 2008).


Exemplificando o que Lacan conceitua por pequeno a: alguém está em um relacionamento e tudo parece “certo”, mas sente uma falta, algo indefinido. Aquilo que não sabe nomear, que escapa, é o objeto a.


 

Real, Simbólico e Imaginário (RSI)

 

Imaginário: um indivíduo vê um perfil no Instagram e imagina que a pessoa tem uma vida perfeita.


Simbólico: quando esse indivíduo interage com essa pessoa usando palavras, emojis e curtidas. Tudo baseado em regras sociais.


Real: descobre que a pessoa tem sofrimentos como as outras, algo que não aparecia na imagem e não pode ser explicado só com palavras. É o furo no que parecia completo.


“A primeiríssima formulação lacaniana de uma teoria do imaginário, em que a gênese do eu era concebida, do mesmo modo que em Melanie Klein, como uma série de operações fundadas na identificação com imagos, era acompanhada em seguida da menção de uma noção de identificação simbólica, definida de maneira ainda vaga, incerta e obscura” (ROUDINESCO, 2008).


Mais tarde, Lacan propõe uma concepção de identificação que vai além do registro imaginário.


“Sob a categoria do simbólico, Lacan fazia entrar toda a reelaboração extraída do sistema lévi-straussiano; o inconsciente freudiano era repensado como o lugar de uma mediação comparável à do significante no registro da língua. Sob a categoria do imaginário eram situados todos os fenômenos ligados à construção do eu: captação, antecipação, ilusão” (ROUDINESCO, 2008).


“Enfim, sob a categoria do real era introduzido o que Freud chamara de realidade psíquica, isto é, o desejo inconsciente e as fantasias conexas” (ROUDINESCO, 2008).



Sujeito dividido


Alguém diz: “estou bem, tranquilo”. Mas seu corpo está tenso, a voz falha, e mais tarde esse alguém sonha com uma situação estressante. Isso mostra que, mesmo sem querer, algo está em conflito. Uma parte quer manter a imagem, outra revela o que está por trás. É o sujeito dividido.


“Quanto ao sujeito, não assimilável a um eu, era primeiramente definido por Lacan como um sujeito do inconsciente: um sujeito dividido segundo a lei freudiana da Spaltung [clivagem], e partilhado segundo a tese psiquiátrica da discordância” (ROUDINESCO, 2008).


“Nessa perspectiva, o sujeito não existe como plenitude: ao contrário, ele é representado pelo significante, ou seja, pela letra em que se marca a ancoragem do inconsciente na linguagem. Mas é representado também por uma cadeia de significantes na qual o plano do enunciado não corresponde ao plano da enunciação” (ROUDINESCO, 2008).



O inconsciente é estruturado como uma linguagem


Sabe quando uma pessoa fala uma palavra errada, tipo “mãe” em vez de “professora”. O ato falho em Freud. Isso é o inconsciente se manifestando como linguagem — ele fala pela pessoa, mesmo sem sua intenção consciente.



Nom-du-Père


Imagine uma criança que quer dormir na cama da mãe todos os dias. Um dia o pai (ou quem faz essa função) diz: “Você tem sua própria cama, agora é hora de crescer.” Isso impõe um limite ao desejo da criança e introduz a regra. Essa “proibição” simboliza o Nom-du-Père — não é só um “não”, é o início da entrada nas regras do mundo.


Não se trata do pai biológico, mas de uma função simbólica que regula o desejo, impõe limites e possibilita o acesso ao campo do simbólico. A presença do Nom-du-Père permite a separação entre a criança e o desejo da mãe, funcionando como metáfora essencial para a constituição psíquica saudável. Sua ausência, segundo Lacan, pode levar a estruturas psicóticas.


“Lacan designava a função simbólica, sublinhando que na família moderna ela se identificava a uma função paterna: função exercida por um pai (…) patogênico e discordante, dividido entre uma nomeação (Nom-du-Père) e uma realidade biológica” (ROUDINESCO, 2008). Enfatizando: essa visão mencionada de Lacan sobre a figura paterna tem aqui a ver com a modernidade.  


  

Estádio do Espelho


Um bebê se vê no espelho e sorri, se empolga com aquela imagem — ele se reconhece ali, mas aquela imagem não mostra o choro, a fome, o desconforto que ele sente. Essa identificação é uma ilusão de unidade. Desde então, ele começa a construir uma ideia de “eu”, que sempre será um pouco diferente do que ele realmente sente.


“A partir da reelaboração freudiana de 1920, duas opções eram, com efeito, possíveis. Uma consistia em fazer do eu o produto de uma diferenciação progressiva do isso, agindo como representante da realidade e tendo a cargo manter as pulsões (ego psychology); a outra, ao contrário, voltava as costas a toda ideia de autonomização do eu para estudar sua gênese em termos de identificação” (ROUDINESCO, 2008).


“Em outras palavras: na primeira opção buscava-se tirar o eu do isso a fim de fazer dele o instrumento de uma adaptação do indivíduo à realidade externa, enquanto na segunda ele era reconduzido de volta ao isso a fim de mostrar que se estruturava por etapas em função de imagos emprestadas do outro”  (ROUDINESCO, 2008).


“Essa segunda escolha foi a de Melanie Klein, mas também de Jacques Lacan quando se apropriou da noção walloniana de estádio do espelho para transformá-la de cima a baixo” (ROUDINESCO, 2008).

 

 

Desejo


Alguém compra um celular novo e fica empolgado... por dois dias. Logo surge outro desejo: um smartwatch, uma viagem, outra coisa. Por quê? Porque o desejo nunca se satisfaz totalmente. Ele está sempre se deslocando, e o que se quer agora é influenciado por outras pessoas.


Roudinesco cita Lacan (2008): “Mas o objeto que ela ataca só tem um valor de puro símbolo, e com esse gesto ela não experimenta nenhum alívio. Entretanto, com o mesmo golpe que a torna culpada perante a lei, Aimée feriu a si mesma e, quando compreende isso, experimenta então a satisfação do desejo realizado: o desejo, tornado inútil, se desvanece. A natureza da cura demonstra, ao que nos parece, a natureza da doença”.

 


 


Referência bibliográfica

 

ROUDINESCO, Elisabeth. Jacques Lacan: esboço de uma vida, história de um sistema de pensamento. Tradução de Paulo Neves. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

 
 

© 2019-2025 por Douglas de Macedo Techera

bottom of page